O Tribunal Constitucional (TC) aplicou uma coima de 5.000,00 € ao PH e outra de 2.300,00 € ao seu ex-Secretário-Geral, por alegadas irregularidades nas contas de 2007.
De acordo com o TC, o PH não reflectiu nas suas contas, como devia, as contas da campanha relativa ao referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez (IVG), em que participou. Refira-se, contudo, que as referidas contas foram oportunamente apreciadas e aprovadas pela entidade competente para o efeito, a Comissão Nacional de Eleições, e que o seu saldo (diferença entre as receitas e as despesas: 239,40 €-238,40 €) foi de 1,00 € (um euro). Assim, a transparência das contas do PH nunca esteve em causa.
Este é apenas um exemplo da forma absolutamente kafkiana como decorre actualmente o processo de apreciação das contas partidárias, especialmente daqueles partidos políticos que não beneficiam de subvenções públicas, como é o caso do PH.
Mas há mais, se não veja-se: o TC entende ser “isento de dúvida que as infracções contra-ordenacionais às regras sobre o financiamento dos partidos e apresentação das respectivas contas são estruturalmente dolosas” (Cfr. Acórdão nº 86/2012). Desta forma, o TC eliminou pura e simplesmente a possibilidade de que a prática dessas infracções possa decorrer de mera negligência, ao arrepio dos critérios legais. Basta, portanto, a verificação do ilícito para que o mesmo seja punível, não tendo o Ministério Público que fazer qualquer prova quanto ao dolo dos arguidos e de nada valendo a estes invocar e desenvolver actividade probatória da ausência do mesmo. Na prática, o TC fez inverter o ónus da prova da culpabilidade dos arguidos neste tipo de processos, contra o que dispõe a Constituição e a lei.
Porém, esse não é o único problema: o TC é simultaneamente a entidade que aprecia a regularidade e a legalidade das contas partidárias como também a que pune os infractores, não havendo qualquer possibilidade de recurso. E o TC é parte interessada na punição dos partidos políticos e seus dirigentes porque as coimas aplicadas constituem receita própria daquele mesmo tribunal!
Finalmente, vale a pena recordar que o limite mínimo legal para as infracções imputadas ao PH é de 4.190,22 € e ao seu dirigente é de 2.095,11 € (cfr. artigo 29º, n.os 1 e 2 da Lei nº 19/2003, de 20 de Junho). Note-se que ambos foram punidos pelos mesmos factos e não por questões diferentes. Ora, esses valores são desproporcionados em relação às despesas do PH no ano de 2007 (= 3.405,52), por um lado, e ao salário médio mensal português, por outro. Na prática, o quadro legal actual e o critério apertado do TC estão a asfixiar financeiramente os partidos políticos, particularmente aqueles que não auferem subvenções públicas, e os cidadãos que aceitam ser seus dirigentes. É caso para dizer que a política está actualmente reservada aos ricos, como acontecia no século XIX. E, nessa medida, o pluralismo político e a democracia participativa, que constituem princípios estruturantes da República Portuguesa, estão a ser postos em causa por este regime legal, maxime na interpretação e aplicação que dele faz o TC. Por isso mesmo, esta situação carece de ser denunciada e modificada.